Qual tipo de verba deve ser dividido no divórcio?
Regra geral, o último pensamento de quem se casa é a separação. Entretanto, em qualquer campo da vida, quem antevê soluções para possíveis situações desagradáveis, sofre menos.
É algo a ser pensado, portanto, por casais que lidam com os mais diversos tipos de fundos e investimentos, como é o caso de FGTS, previdência privada etc.
A análise adiante se refere ao regime de bens mais comum no Brasil: comunhão parcial de bens. Ele basicamente prevê que o que foi adquirido antes da união é de cada dono original, mas o que foi adquirido durante a união, independente de sua origem financeira[1] e no nome de quem for registrado, pertence 50% a cada um.
Seguindo essa lógica, com o fim do casamento ou da união estável, como é a divisão de verbas como FGTS e previdência privada?
Segundo o Código Civil no artigo 1.659, incisos VI e VII, os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge e outras rendas semelhantes estariam excluídos da comunhão, ou seja, não deveriam ser divididos pelo casal.
Contudo, os tribunais têm feito uma interpretação diferente do dispositivo. O entendimento hoje predominante é que os salários são partilhados, pois frutos do esforço comum de ambos. Já que quem utiliza o dinheiro para adquirir algum bem tem a obrigação de dividi-lo, não faria sentido quem deixa de utilizar o dinheiro não possua o mesmo dever.
Em 27/04/2017 a 3ª Turma de Direito Privado do Superior Tribunal de Justiça (STJ), tribunal responsável pela uniformização de questões correlatas à legislação federal, decidiu que investimentos feitos em previdência privada fechada não devem ser divididos entre o ex-casal, pertencendo exclusivamente ao beneficiário da previdência. Leia mais sobre a decisão do REsp 1477937/MG aqui.
Já em 09/03/2016 a 2ª Seção do STJ analisou a partilha de FGTS, decidindo que este deve ser partilhado, com duas regras:
a) o valor a ser partilhado é equivalente aos anos de união (ou seja, se o saldo de FGTS corresponde a 15 anos de trabalho, mas o relacionamento coincide apenas com os 3 últimos anos, é em relação a eles que ocorrerá a partilha) e;
b) a partilha não é autorização para o saque do FGTS, eis que as possibilidades para tanto são fixadas por lei, de modo que se não houve a utilização da verba na constância da união, a divisão deve ocorrer quando do seu regular levantamento.
O que podemos extrair dessas duas decisões? Ambas se debruçaram sobre verbas que não são idênticas, mas guardam semelhança e, enquanto uma foi proferida por uma Câmara, a outra foi proferida por uma Seção.
Existem 6 Turmas no STJ e 3 Seções, divididas entre direito público, direito privado e direito penal. Cada Seção reúne ministros de duas Turmas, também especializadas. As Seções são compostas por dez ministros e as Turmas por cinco ministros cada.
Assim, o julgamento da Seção demonstra uma tendência nas decisões uniformizadoras do Tribunal, já que tomadas por mais ministros de diferentes turmas. Levando isso em consideração, é possível que, sendo a partilha de previdência privada fechada levada a julgamento pela Seção, venha esta a entender pela semelhança com o FGTS e definir também pela sua partilha.
Ou seja: os casais se encontram numa situação indefinida, sujeita à variedade de entendimentos espalhados entre os juízes, e à própria instabilidade de entendimento do tribunal superior.
É possível se proteger em relação a tal insegurança. O ideal é que, diante de tal dúvida, busque informação e auxílio de um profissional que atue com Direito das Famílias, evitando um resultado que não desejem no futuro.
[1] Com algumas exceções. Por exemplo, se A possuía um apartamento antes de casar-se com B, e vende o imóvel para que adquiram uma casa maior, a parcela referente ao apartamento continua sendo exclusiva de A, sendo importante fazer esse registro no documento do imóvel para que a prova não se perca no tempo.
Fonte: Brito & Simonelli (12/03/2018)
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