sexta-feira, 15 de dezembro de 2023

Fundos de Pensão: Trabalhadores apelam a Lula para tentar salvar o Postalis (Correios)



Ainda sob o risco de ver ruir um edifício financeiro construído com os aportes realizados pelos trabalhadores dos Correios desde 1981, os contribuintes do Postalis, fundo de pensão da estatal, encaminharam uma carta ao presidente Lula para pedir o socorro do governo federal na busca por uma solução para a batalha judicial travada contra o Bank of New York Mellon (BNY Mellon) em uma crise que já dura uma década.

A instituição norte-americana é investigada desde 2018 pelo Ministério Público Federal, sob a acusação de gestão fraudulenta. em um processo que corre em segredo de Justiça, acusada de realizar uma gestão fraudulenta que causou um rombo de oito bilhões de reais somente na principal carteira de investimentos do fundo de pensão, conhecida como Plano de Benefício Definido.

Ameaçado de falência e às voltas com o enésimo plano para reequilibrar seu patrimônio, o Postalis amarga hoje um rombo próximo aos doze bilhões de reais, segundo seu Conselho Fiscal.

A carta, assinada pela Associação dos Profissionais dos Correios (Adcap) e pela Federação Nacional dos Trabalhadores em Empresas de Correios e Telégrafos (Fentect), entre outras entidades, pede o apoio de Lula para “mitigar a dramática situação em que se encontram os empregados, aposentados e pensionistas de uma das mais importantes empresas públicas do País”.

As sugestões enviadas à Presidência incluem a implementação de ações administrativas e diplomáticas contra o BNY Mellon, bem como a notificação da U.S. Securities and Exchange Commission, a autoridade reguladora do mercado de valores mobiliários dos Estados Unidos, similar à CVM do Brasil. A carta também pede que o governo brasileiro considere quais medidas podem ser tomadas contra o BNY Mellon nos Estados Unidos.

Os trabalhadores pedem ainda que o governo agende uma reunião com representantes dos ministérios da Justiça e Segurança Pública, das Comunicações, das Relações Exteriores e da Fazenda. A ideia é o governo definir junto a representantes de beneficiários do Postalis, estratégias para solucionar a crise no fundo de pensão. Eles propõem que o Ministério da Justiça, através do seu Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), argumente em uma possível ação contra o BNY Mellon com base nas práticas internacionais anti-corrupção recomendadas pela ONU. Além disso, sugerem acionar o Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI), organização da qual tanto o Brasil quanto os EUA são membros.

A carta sugere também ações internas contra o banco e pede a avaliação do assunto por parte da Advocacia Geral da União (AGU), “considerando que dinheiro público está sendo utilizado para pagar a parte devida pelos Correios no equacionamento dos danos causados pelo BNY Mellon no Plano de Benefício Definido do Postalis”. O documento enviado pelos trabalhadores dos Correios a Lula pede a convocação do BNY Mellon para que o banco “explique os fatos” ao Ministério da Justiça, à CVM e à AGU e apresente uma proposta efetiva para ressarcir os prejuízos causados ao Postalis e à estatal. Também é sugerido que o Banco Central do Brasil faça uma reavaliação da carta patente obtida pelo BNY Mellon para operar no País, com “possíveis aplicações de punições, se for o caso”.

Para Roberval Borges, presidente da Adcap, a crise financeira do Postalis é resultado de três fatores. Primeiro, o encerramento compulsório e a liquidação do plano em 2005 e 2008. Segundo, os investimentos fracassados que não foram impedidos pela empresa patrocinadora do fundo de pensão, os Correios, apesar de a lei determinar claramente que eles têm a responsabilidade de fiscalizar a gestão dos recursos. Terceiro, a atuação do BNY Mellon, que ocorreu sem a intervenção da Superintendência de Previdência Complementar (Previc), o órgão regulador e fiscalizador do sistema, que desde 2012 monitora a gestão do Postalis através de uma auditoria constante, mas não evitou o uso indevido dos recursos economizados pelos participantes. Diante desses fatores, Borges argumenta que o governo Lula tem motivos suficientes para agir de maneira efetiva na resolução da precária situação do Postalis.

Presidente do Conselho Fiscal do Postalis, Fábio Conde espera que a carta enviada a Lula chame a atenção do governo e da sociedade para a urgência de impedir que o BNY Mellon, um grande banco estrangeiro, cause a falência de um dos mais relevantes fundos de pensão do Brasil: “O BNY Mellon é o maior banco depositário do mundo. Para que tenha interesse em negociar, é necessário que haja pressão social e política.” Conde diz que tanto o governo quanto o Congresso têm muito a contribuir para o fim do impasse, que atravessou os governos de Dilma, Temer e Bolsonaro: “Esperamos que o governo nos apoie, até porque metade desse prejuízo é pago pelo próprio governo através dos Correios”.

Além do déficit financeiro causado pela má administração do BNY Mellon, o Postalis enfrenta um déficit atuarial relacionado à Reserva Técnica de Serviços Anteriores (RTSA), uma dívida assumida pelos Correios como empresa patrocinadora quando do fechamento do Plano de Benefício Definido. Conde explica que os Correios iniciaram o pagamento da RTSA, mas interromperam em 2014. Esta questão é crucial para que os beneficiários do Postalis possam recuperar o valor perdido e diminuir as contribuições extraordinárias que estão pagando atualmente. A situação está sob análise judicial e a expectativa no Postalis é que não ocorram progressos significativos até que seja proferida uma decisão de primeira instância. Conde acredita que uma decisão judicial favorável ao Postalis poderia abrir uma oportunidade para negociação.

Roberval Borges diz que, apesar do diálogo permanente entre as direções do Postalis e dos Correios, a questão da RTSA ainda não teve avanços significativos. Isso ocorre apesar de existirem ações judiciais em andamento há quase uma década, movidas tanto pela Adcap contra os Correios quanto pelo próprio Postalis contra os Correios. O presidente da entidade critica a lentidão do Judiciário em julgar um assunto de tamanha importância e enfatiza a necessidade de mais ação concreta e menos discursos por parte das autoridades envolvidas.

Fonte: Carta Capital (14/12/2023)

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